Online não é disponível

Isso não é sobre status de redes sociais

Maithê Prampero
4 min readSep 8, 2024

Acreditamos, muitas vezes, que sabemos de nossos desejos, daquilo que queremos e não queremos. É importante conseguir delimitar limites, fronteiras, tolerâncias. Entender o que te é insustentável ajuda em muitos passos do caminho.

Em nossa arrogância humana, acreditamos ser donos da casa. Sei de mim, tenho autoconhecimento. Dizemos que sabemos bem quem somos, mas a verdade é que podemos nos surpreender com nossos interiores de sujeitos perdidos — e confusos.

Entendo agora que estar online na vida não é estar disponível. Estar sorrindo não significa alegria, e chorar não é indicativo garantido de tristeza. Sorrir pode ser um super indício de alguém que está sem graça, assim como o choro pode vir após uma boa notícia, ou após sentir alívio.

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Peguei a época do MSN, quando ainda escrevíamos indiretas em nossos status, e balançávamos as janelas de conversas, como uma forma nada discreta de dizer “ei, eu estou aqui”. As redes mudaram. Ainda existem indiretas — e diretas. Hoje tiramos a visualização e tentamos nos esconder, porque tudo se tornou invasivo demais, íntimo demais, perturbador.

Nesta época, conversávamos com início, meio e fim. Deixávamos claro que havia uma vida. Estávamos online, mas nem sempre disponíveis. Era comum que eu estivesse com minhas folhas de almaço, escrevendo sobre as doenças para a aula de Biologia, enquanto conversava com colegas. Adorava trocar, rir e colocar música na minha página. Sabia, entretanto, o momento de dizer tchau, para focar em coisas fora da tela. E ficava tudo bem.

Nos perdemos. Todos nós. Esquecemos de estar presentes no aqui e agora, pensamos demais nos erros cometidos, e no futuro, que não nos pertence. Sem garantias, decidimos tentar controlar a tudo e todos, como uma tentativa de assegurar alguma coisa. Logo nós, que nem somos donos de nossos próprios pensamentos. Nos escapa pelas mãos as mensagens do inconsciente, a subliminar arte dos lapsos.

Tentamos, insistentemente, voltar a um passado em que havia uma relação mais saudável com nossos corpos, amigos, interesses amorosos. Tentamos estar verdadeiramente disponíveis, mas acabamos online na maioria das vezes. Sem nem ao menos lembrar o que foi falado em uma roda de amigos, ou as datas importantes. Sabemos de tudo via quinze segundos de vídeo, mas não sabemos, no fundo, não sabemos.

Talvez as delimitações do “quem sou” e “o que quero” possam começar daí: o esforço de estar realmente onde se está. No tempo vivido. Quero estar disponível em minhas conversas, quando vejo um filme, quando estou com pessoas amadas, e nas minhas escolhas de gasto de tempo, energia, saúde.

Dizemos ao outro que queremos algo, mas não sabemos direito. Tentamos. Erros e tentativas guiando um caminho que é breu. Caminho que não deixará de ser vendado, apenas exige aceitação para ser menos doloroso. É o preço que se paga.

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Tenho certezas quanto ao amor que quero viver, e foco nisso, verdadeiramente. Esqueço, entretanto, dos amores tantos que me cabem diariamente. Amores e afetos que escapam do que a influencer prega como uma excelente vida, ou do que me disseram que seria objetivo de uma vida inteira. Terminei em fragmentos.

Faço escolhas, e erro muitíssimas vezes. Esse texto não impedirá que os desencontros da vida aconteçam, mas me deixará pronta para aceitar partes minhas, humanas.

Agora já sei que ouvir de alguém que existe disponibilidade, pode significar apenas uma bola verde, indicando que a pessoa está ali. Está mesmo?

Quando dizemos que queremos algo, o quanto realmente queremos? Quando falamos dos nossos sonhos, serão de fato sonhos? Que movimentos estaremos dispostos a realizar em prol deste verbal que usamos com nenhuma responsabilidade?

Não é uma bronca, mas se for, é para mim também. E para você. E para todo mundo. Existe o caminho de seguir fingindo que está tudo bem, ou o caminho de parar, pensar e entender que está tudo bagunçado.

“Do you believe in life after love?”

Acreditando ou não, a vida precisa seguir. Sempre. Amanhã, com ou sem amor, a vida vai seguir. Vai ser segunda-feira, o despertador irá tocar. Vou envelhecer mais um dia. Mais um aprendizado: acredite na vida, o amor é consequência. É impossível passar pela vida sem amor, ele sempre vem, de algum canto, de muitos lugares, ele aparece. Isso é garantia.

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Só é necessário estar disponível. Não online, disponível. A vida de verdade acontece no offline.

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